terça-feira, 27 de outubro de 2015

Estado Laico versus Religião



                   Quando falamos em religião, pensamos em algo que reúne em torno de uma mesma espiritualidade aqueles que a professam. No Brasil, as múltiplas religiões que existem, co-existem num mesmo Estado Político cujas leis colocam todos os seus adeptos debaixo dos mesmos direitos e deveres para com o Estado e à sociedade. Isto está garantido no que se convencionou chamar de “laico”, ou seja, na “laicidade”. Muito se ouviu falar, nos últimos meses, neste termo. Frases como “o Estado é Laico” foram vomitados nas bancadas do Congresso Nacional, nas Tribunas, nas Comissões, que tinham por discussão temas que, em certa medida, tocava em dogmas de determinados grupos religiosos e/ou ideológicos. Fato este que pudemos assistir com a aprovação da PL 6583/2013 (Estatuto da Família) pela Câmara dos Deputados, no final de setembro/2015.

                               Mas, ao passo que se ouve falar acerca da “laicidade”, pouco se compreende o que significa um Estado Laico. Vale a pena, compreendermos este termo para que possamos entender o que se está afirmando acerca do Estado Político. Um Estado Laico é um conceito do secularismo onde o poder do Estado é oficialmente “imparcial” em relação às questões religiosas, “não apoiando nem se opondo” a nenhuma religião. Ou seja, existe uma neutralidade no que concerne à intervenção do Estado em favor de uma ou outra religião, ou naqueles que querem determinar algo contra uma religião.

                               Qual é a problemática? É que representantes de minorias religiosas e ideológicas ocupam hoje cargos políticos. Muito embora, tenham sido eleitos como representante do povo, eles representam “suas próprias” convicções pessoais e religiosas. Sim, pois, é isso que estamos assistindo no cenário político brasileiro. São políticos da minoria, que querem impor suas convicções ideológicas sobre a maioria. Enfim, dos dois lados, nos seus pontos de vista, os dois grupos representam uma minoria frente aos demais. O que estamos assistindo no cenário político brasileiro é um briga ideológica e religiosa, cujo objetivo nada tem a ver com o bem do povo brasileiro. E sim, com o bem estar de uma minoria em detrimento de uma grande maioria. É uma luta de braço de ferro, ganha quem pode mais, quem grita mais alto, quem comove o maior número de pessoas.

                               Mas e o povo? Povo!? Que povo? Para eles, não existe o povo. O que existe são seus ideais religiosos, ideológicos, opiniões, bandeiras, dogmas e etc., o resto deve se render a eles.

Pense nisso!


Professor Juliano Marcel
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quinta-feira, 9 de julho de 2015

Introdução ao pensamento de Maquiavel II

O cardeal Giovanni de Medicis, em 1513, assume o papado como Leão X. Os Médicis, que por sua vez eram odiados pelos florentinos por terem derrubado a república, agora são aceitos e aclamados como os novos governantes.

Maquiavel apresenta e dedica, em 1515 sua obra O príncipe a Lorenzo II de Médici. É recebido com indiferença e continua desta forma, afastado da política vigente. Dedica-se significativamente à literatura e a outros contextos como reuniões de um cenáculo de escritores e poetas (em Florença). Em tempo, conclui sua obra Discurso sobre a primeira década de Tito Lívio (1517). Em 1518 escreve: A mandrágora, Belfagor arcidiavolo (novela) e Discurso ou diálogo a respeito da nossa língua.

Com a morte de Lorenzo II de Médici, em 1519, Maquiavel retorna às atividades políticas. A pedido do papa, o cardeal Júlio de Médici, novo sucessor do cargo, solicita a Nicolau a tarefa de comentar a futura ordem de Florença. Escreve então o Discurso das coisas florentinas depois da morte do jovem Lorenzo de Médici.

O Tratado ‘Da arte da guerra’ começa a se tornar realidade, finalizando-o em 1520. Trabalhos diplomáticos e literatura fundamentam-se, delineando na mesma época, a pedido da universidade (Studio florentino), a obra Histórias florentinas, finalizada cinco anos mais tarde. A vida política não se formatava como algo sistemático. Maquiavel resolve se afastar da mesma e voltar seus esforços ao patamar literário, que crescia efetivamente. Em 1525 escreve uma segunda comédia denominada Clizia. Mesmo afastado da política, em 1525, é novamente restabelecido suas funções.

Dentre várias comissões diplomáticas, Maquiavel integra e coopera na criação de um conselho de defesa florentino. Toma parte das estratégias da campanha contra o império. Em 1527, Roma cai aos pés de Carlos V, suscitando uma rebelião em Florença, que se vê forte e derruba o governo dos Médicis, restabelecendo o regime republicano. O príncipe, obra conhecida não só pelos Médicis, mas pelo grupo de conflito estabelecido entre outros, elegem a antipatia e a frustração de se tornar um ser odiado por todos. O príncipe um documento destinado a ensinar aos ricos como tirar a liberdade dos pobres; os chorões (os seguidores de Savonarola) tinham Maquiavel como herético; os bons o consideravam um desonesto; os tristes o achavam mais triste ou mais valente do que eles; assim, todos o odiavam” (MAQUIAVEL apud CABRA, 1996, p. XXXII).

Pobre, doente, desgostoso e só, lembrado apenas por alguns poetas e literatos do cenáculo dos Orti Oricellari, vai a óbito em vinte e um de junho de 1527.

Atribuição de conceitos

Da realidade concreta, do agora, do que se vê, sensorialmente, e não como projeção futura ou histórica de um objetivo ou concepção, são fundamentações atribuídas e discutidas nos enlaces contextuais de Maquiavel – a verdade efetiva das coisas. “Esse caminho inverte o curso tradicional: enquanto ‘muitos imaginaram repúblicas e principados que jamais foram vistos e que sequer sabemos se existiriam de verdade’ (Príncipe, XV), ele considera ‘mais conveniente ir diretamente à verdade física da coisa’ (Príncipe, XV). Maquiavel pensa, pois, que a ‘novidade’ de seu ensinamento está em ruptura com o afirmado pela tradição” (AMES, 2000, p. 251).

Nicolau pensa o Estado como capacitado a proporcionar e impor ordem. Outrossim, seu norte preconiza uma leitura concreta de um estado capaz de se tornar coeso e fundamentado na ótica perceptiva de vida, realidade, sensorial, em que os aspectos formativos reformulam sistematizações pautadas na execução, na análise da realidade presente, concreta, o hoje, e não que concepções históricas não são significativas.

Recomenda que se tomem como parâmetro as ações dos grandes homens, pois ainda que seja difícil ao imitador alcançar a mesma virtu do imitado, sempre haverá algum ganho: deve-se fazer como os arqueiros prudentes, que querendo atingir algum ponto muito distante, e conhecendo até onde vai a força do seu arco, miram mais alto do que o lugar visado, não para que sua flecha alcance tal altura, mas para poder, com a ajuda da mira elevada, atingir o ponto por eles imaginado” (RODRIGO, 1996, p. 18).

O caos e a estabilidade, fatores constituintes de uma realidade estatal em que se processam as indagações teóricas de Maquiavel. Politicamente pensando, Maquiavel assume a postura de abandono de argumentos tradicionais, histórico-secular, em que as concepções de natural e eterno são colocadas em justaposição ao que se percebe no concreto.

Construir a ordem, em um estado maquiavélico, formula a concepção de ordem enquanto produto essencial à política, não é algo que se materializa ou acontece à sorte, mas depende do trabalho e da formatação humana no intento de inibir a desordem, a crueldade e a selvageria. Há a necessidade de uma vigilância proposital, a fim de evitar os germes que sempre se pautam nessa questão.

“Maquiavel foi radical quanto à secularização e apontava a falência de velhos métodos como motivo para a busca dos novos, atenuando a perspectiva religiosa-militar e em face da perspectiva legal-estratégica” (JACARANDA, 2008, p. 50).

A política na visão de Maquiavel é o resultado de feixes de forças, proveniente das ações concretas dos homens em sociedade, ainda que de imediato reconhecíveis (WEFFORT, 2005, p. 18). A identificação motívica e efêmera do processo em si constituído, alavanca concepções que se fundamentam em novos fatos de difícil compreensão, re-signif icações que são justapostas além de si.

Há também que se formalizar a concepção de poder que por si só todos sentem, porém não conhecem. Fundamenta discursando sobre a instabilidade das coisas, mostrando que a vida privada é acometida de concepções e combinações diversas que se diferenciam da vida política. “...O mundo da política não leva ao céu, mas sua ausência é o pior dos infernos” (WEFFORT, 2005, p. 18).

REFERÊNCIAS

AMES, J. L. Maquiavel: a lógica da ação política. 2000. Tese (Doutorado em Filosofia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

JACARANDÁ, R. F. Pelas razões do Estado: o maquiavelismo e os arcanos da estatalidade moderna. 2008. Tese (Doutorado em Filosofia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

MAQUIAVEL, N. O príncipe. Tradução de Maria Júlia Goldwasser. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

RODRIGO, L. M. O imaginário do poder e o poder do imaginário em Maquiavel. 1996. Tese (Doutorado em Filosofia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

WEFFORT, F. C. Os clássicos da política: Maquiavel, Hobbes, Locke, Montesquieu, Rousseau, ‘O Federalista’. v. 1. 13. ed. São Paulo: Editora Ática, 2005.

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Introdução ao pensamento de Maquiavel

Nicolau Maquiavel nasce na Itália, em Florença, terceiro de quatro filhos, no dia 3 de maio de 1469. Experimenta um ambiente norteado de cultura. Seu pai era advogado e tinha uma vida controlada, podendo desta forma proporcionar o estudo e a formatação dos anseios pré-iniciais do menino Nicolau. Por volta dos sete anos, o latim e a matemática cerceiam o processo formativo do garoto prodígio. Um ano mais tarde, dá sequência a seus estudos na Escola Poppi (Igreja de São Benedito). O estudo do latim e seus autores tornam-se substanciais. Em 1595, acredita-se que é de Maquiavel (aos vinte e seis anos de idade) a transcrição do documento que defende uma visão matemática do mundo, oposta ao espiritualismo de Savonarola (padre reformador - governou Florença, pregando uma vida simples, recatada, distante dos abusos sociais), em voga naquele tempo.

Maquiavel, ao estudar a história das repúblicas mais proeminentes, constata que a sua força diminui com o tempo, seus costumes perdem força e capacidade de espelhar o espírito das leis, “pois como os bons costumes, para se manter, têm necessidade das leis, e as leis, por sua vez, têm necessidade, para serem observadas, dos bons costumes”. Ele constata que a constituição corrompe-se.

Perdeu-se hoje o sabor desse conceito. Fala-se da corrupção proporcionada pela burocracia, dos políticos, mas não sabemos mais o que quer dizer um povo corrompido. Tanto em Maquiavel quanto nos autores que o precederam, a corrupção marcava os limites do político. De um corpo político corrompido não se pode esperar mais nada, suas leis são incapazes de conter a violência privada, o Estado deixa de representar seus interesses legitimadores e os consorciados visam apenas o bem próprio, sem maiores preocupações com a coletividade que a cidade representa. Abre-se, desse modo, espaço para um regime autoritário, tirano.

O que Maquiavel descobre, portanto, não é a independência da ética e da política. Assim como Platão, ele é cético quanto à possibilidade de recuperar um povo que se corrompeu totalmente, mas não deixa de ver, partindo do exemplo das cidades italianas de seu tempo, que lá onde os valores não contam mais continua a existir uma sociedade política.

Maquiavel aponta para os limites da ética cristã, mostrando que ela é incapaz de guiar os homens na construção de uma república virtuosa. Ele nos leva a pensar que o aspecto mais nefasto da tirania é que ela exista como uma prolongação da vida política normal, demonstrando pelo silêncio, pelo medo ou pelo cinismo a incapacidade da ética em evitar a irrupção da barbárie.

Prof. Juliano Marcel

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